Temendo protestos, ministro manda cancelar reunião sobre clima em Salvador
Climate Week seria realizada em agosto e visa promover soluções para a crise climática; é o segundo evento internacional sobre o tema cancelado pelo governo Bolsonaro
DO OC – O Brasil retirou a oferta de sediar a Climate Week Latin America, um evento regional da Convenção do Clima da ONU que aconteceria de 19 a 23 de agosto em Salvador. Segundo o OC apurou, a decisão foi do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo-SP), que temia protestos de ambientalistas contra sua gestão durante o encontro.
A desistência foi comunicada na semana passada à Prefeitura de Salvador, que organizava o evento juntamente com a convenção da ONU, a UNFCCC. “Tentamos reverter, mas não teve jeito”, disse o secretário de Sustentabilidade da capital baiana, André Fraga.
A desistência deverá ser comunicada formalmente pelo ministério nesta semana. Mais uma vez, o argumento será a necessidade de dedicação a “problemas tangíveis”.
Nesta segunda-feira, os organizadores do evento do lado da ONU circularam um comunicado interno lamentando a decisão do governo brasileiro e afirmando que estão “explorando opções” de uma cidade que tope sediá-lo. Salvador está escolhida para sediar a Climate Week desde o ano passado. Faltam três meses para o encontro.
É bom a UNFCCC já ir se acostumando com recuos do Brasil. Em novembro do ano passado, por ordem do presidente eleito, Jair Bolsonaro, o governo Temer cancelou a oferta de sediar a COP25, a conferência diplomática anual sobre mudanças climáticas, causando constrangimento na ONU e arranhões à imagem internacional do país. Apenas um mês antes, o Itamaraty comemorara a indicação do Brasil como sede, afirmando ser um “reconhecimento” ao papel de liderança do país na agenda de clima. O Chile se ofereceu para sediar o encontro órfão.
O prefeito de Salvador, ACM Neto, presidente do Democratas, já havia oferecido a cidade para sediar a COP. Sem esta opção, ficou com a Climate Week como prêmio de consolação e já vinha preparando a cidade – que deve publicar em breve seu plano municipal de mudança do clima.
No caso da COP25, Bolsonaro tinha a desculpa dos custos: estima-se que uma COP custe cerca de R$ 200 milhões. Segundo André Fraga, não havia esse argumento desta vez, já que os custos seriam bancados pela cidade-sede. “É uma visão estreita do que seja desenvolvimento”, afirmou.
Diferentemente da COP, que é um evento político, a Climate Week se dedica a negócios e troca de experiências. É um encontro para a demonstração de soluções para a crise do clima, e envolve maciçamente o setor privado.
Ela antecede a semana do clima de Nova York, que ocorre antes da reunião da Assembleia Geral da ONU, em setembro.
O OC procurou o MMA para esclarecimentos nesta terça-feira. Esta página será atualizada caso o ministério se manifeste. O ministro declarou à jornalista Andreia Sadi que não faria sentido manter a Climate Week no Brasil porque a COP será no Chile, e que fazê-lo só serviria para “o pessoal de sempre” “fazer turismo” e “comer acarajé”.
“Vou manter um encontro que vai preparar um outro [sic], que não vai acontecer mais no Brasil, por quê? Não faz o menor sentido, vai para o Chile! Vou [sic] fazer uma reunião para a turma ter oportunidade de fazer turismo em Salvador? Comer acarajé?”
Diferentemente do que o ministro afirmou, a Climate Week Latin America não é “preparatória” para a COP, visto que os encontros têm agendas e objetivos distintos. Além disso, a decisão de fazer o evento no Brasil foi tomada em 22 de agosto do ano passado, antes mesmo de o país ter a confirmação de que sediaria a COP. O governo Bolsonaro ordenou o cancelamento da COP no Brasil em novembro, mas nada fez sobre a Climate Week.