Péssimo para o planeta, pior para os EUA
Trump assina decreto eliminando plano de energia limpa de Obama, o que deve impedir EUA de cumprir meta de Paris e pode pôr objetivo global de temperatura e economia americana em xeque
O planeta bateu seu terceiro recorde seguido de aquecimento em 2016. Os cientistas alertam que, se quisermos ter alguma chance de evitar uma catástrofe climática neste século, precisamos acelerar – e muito – a redução de emissões.A ONU reforça que só teremos mais três anos para produzir a mudança decisiva que permitirá estabilizar o aquecimento global em 1,5oC. A decisão de Trump praticamente elimina essa possibilidade, já que o Plano de Energia Limpa é uma parte importante da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) dos EUA.Se a ideia de Trump é parar a mobilização climática, o plano não deve funcionar. O Acordo de Paris está em vigor e já foi ratificado por 141 países. A revolução econômica sacramentada por ele está em pleno curso e não será fácil revertê-la. A própria matriz energética americana já se enveredou no sentido da descarbonização: em 2016, segundo a Agência Internacional de Energia, as emissões dos EUA caíram 1,6%, com a economia crescendo 3%, as menores em quase 30 anos.
Além disso, os benefícios climáticos e de saúde do Plano de Energia Limpa poderiam chegar a US$ 93 bilhões por ano em 2030, e custariam apenas US$ 8,8 bilhões por ano para implementá-lo. Para quem se diz o empresário mais bem-sucedido que já caminhou sobre a Terra, Trump demonstra uma capacidade assombrosa de rasgar dinheiro. O do contribuinte, pelo menos.
O mundo caminha para o fim da era dos combustíveis fósseis. Tentar adiar esse fim, como Trump está fazendo, contra o bom senso econômico, apenas aumentará o tamanho do tombo. Este deve chegar antes do que se imagina: novos estudos sugerem que os carros elétricos podem fazer a demanda por petróleo chegar ao pico até 2020.
“O conjunto de políticas de Trump desestimula a inovação, que sempre foi o motor do crescimento americano, no setor mais quente da economia global, o de energias renováveis”, diz Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima. Segundo ele, a economia do século 21 está se afastando definitivamente das fontes de energia dos séculos 19 e 20, e outros países, como a China, vêm assumindo a liderança nessa transição. “O Brasil, que hoje coloca mais de 70% de seus investimentos do setor de energia nos combustíveis fósseis, em especial no pré-sal, deveria se dar conta do risco que corre ao fazer isso.”
“Para favorecer seus aliados da indústria fóssil, Trump abdica o interesse estratégico dos EUA e expõe sua população aos impactos das mudanças climáticas, já que o governo também vai parar de investir em adaptação”, diz André Ferretti, gerente de Estratégias de Conservação da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário e coordenador-geral do Observatório do Clima. A ação climática, no entanto, segue firme nas esferas estadual e municipal, nos bancos e nas empresas. “As companhias americanas não vão querer, nem poder, ficar de fora da economia de século 21. Isso certamente levará o país para o rumo certo, independentemente dos rompantes do míope de plantão na Casa Branca”.