Protesto contra Trump nos EUA (Foto: Brad Hagan)

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Negacionistas voltam à carga na era Trump

Ação coordenada de congressistas republicanos e blogueiros contra pesquisadores de agência federal mostram que ideologia anticiência ressurge com força nos Estados Unidos

06.02.2017 - Atualizado 11.03.2024 às 08:27 |

DO CLIMAINFO
DO OC

Aqueles que negam o fato do planeta estar esquentando como resultado das atividades humanas apontam uma suposta “pausa” no aquecimento para justificar sua oposição à ação de proteção ao clima. Essa turma voltou ao ataque usando como alvo um estudo – liderado por Tom Karl, cientista da Noaa (Agência Nacional de Oceanos e Atmosfera dos EUA) e publicado na revista Science em 2015 – que refutou categoricamente a ideia da “pausa”. Este foi um de muitos estudos que o fizeram, mas os altos perfis do pesquisador e da instituição o transformam em alvo.

Neste sábado, um artigo publicado no jornal inglês Mail por David Rose faz afirmações já refutadas pelo estudo, que o próprio Rose logo depois corrigiu (em parte) no Twitter. Rose, que tem um histórico de reportagens desleixadas, cria um escândalo a partir de uma carta de um ex-funcionário do Noaa publicada em um blog dedicado a negar as mudanças climáticas. A carta faz acusações de desonestidade na metodologia e nos procedimentos de arquivamento dos dados usados no estudo — acusações que, por sinal, já foram desmascaradas.

Várias refutações aos argumentos do artigo foram publicadas em tempo recorde, sendo que em alguns minutos apareceu um tuíte que o descreve como “tão errado que é difícil saber por onde começar”:

– John Abraham contextualiza os dados no The Guardian e aponta os muitos fatores que Rose deixa de lado e que, se considerados, acabam com suas alegações de má conduta;

– Zeke Hausfather, em uma checagem de fatos, discute as várias linhas de evidência que apoiam os resultados do trabalho de Tom Karl. Hausfather publicou um estudo em 2016 que confirma o aquecimento contínuo do planeta e mostra que não existiu uma “pausa” real no aquecimento;

– Peter Thorne, do Irish Climate Analysis and Research Units, que, diferentemente do autor da carta, trabalhou diretamente no estudo de Tom Karl, identifica uma série de aspectos-chave nas alegações de “má representação dos processos que realmente ocorrem e diz que, em alguns casos, estas são publicamente verificáveis”;

– Victor Venama, do Organização Meteorológica Mundial, discute tanto as especificidades dos conjuntos de dados quanto o contexto despreocupado do artigo, para ajudar a entender o relato do artigo de Rose.

Mesmo assim as falsas alegações de Rose foram rapidamente ecoadas por vários blogs e veículos da mídia conservadora, e elogiadas por Lamar Smith, um republicano do Texas cuja carreira tem sido financiada pelos combustíveis fósseis e cuja presidência do Comitê de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Representantes dos EUA se transformou no que um colega descreveu como uma “cruzada ideológica” e uma caça à bruxas contra a Noaa e o pesquisador Tom Karl.

No seu artigo, David Rose retratou a queixa do ex-funcionário como prova do escândalo e apelidou-a de “Climagate 2”. Assim como a acusação de manipulação do Climagate (que foi desacreditado por oito agências independentes), esta tentativa de construção de um Climagate 2 é uma notícia falsa que serve como cobertura para atacar as múltiplas linhas de evidência e o esmagador consenso da realidade da influência humana sobre o clima. Vale notar que Lamar Smith realizará uma audiência intitulada “Making EPA Great Again” nesta semana.

Os cientistas  parecem ter aprendido algo com o Climagate “original”, de 2009: segundo o site Inside Climate News, três organizações científicas anunciaram ter entrado na Justiça como amicus curiae dos pesquisadores da Noaa, que se defendem de uma ação judicial movida por um grupo conservador, que demanda que Karl e seus colegas liberem 8.000 páginas de mensagens trocadas sobre o artigo questionado.

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