Brasil entra no grupo que pede ambição
Coalizão por acordo ambicioso tem mais de 130 países, com interesses diferentes. Principal objetivo é mensagem política de esforço para alcançar um bom tratado de clima
CÍNTYA FEITOSA
CLAUDIO ANGELO
DO OC, EM PARIS
A um dia do término da conferência de clima das Nações Unidas, o Brasil anunciou nesta sexta-feira a sua adesão à “Coalizão de Alta Ambição” da COP21. A iniciativa, que reúne mais de 100 países, é puxada pelas Ilhas Marshall, uma das pequenas nações insulares do Pacífico, e tem membros como Estados Unidos e União Europeia. O objetivo é político: manifestar o compromisso de trabalhar para o melhor acordo em Paris. Países como Venezuela e China, com a fama de travar pontos importantes da negociação, não aderiram.
Na noite de quinta-feira não havia qualquer sinalização da entrada do Brasil na coalizão – um membro da delegação brasileira comentou que o país não havia sido convidado. “Não é uma iniciativa para pressionar as negociações, é uma iniciativa independente”, disse a ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) hoje. “Aderimos porque nos chamaram, e nós e as Ilhas Marshall temos as únicas INDCs [metas nacionais] absolutas e para toda a economia”, desconversou.
Apesar de a ministra ter minimizado o fato, a adesão do Brasil foi anunciada com pompa e circunstância pela coalizão: afinal, trata-se do primeiro país do grupo BASIC (que inclui os gigantes do mundo em desenvolvimento) a aderir. A entrada do país foi anunciada na entrevista coletiva mais concorrida do último dia “oficial” de COP, que contou com a presença da chanceler da Alemanha, Barbara Hendricks, e da ministra do Meio Ambiente da Noruega, Tine Sundtoft.
“É uma demonstração de boa vontade, e especialmente interessante considerando que o Brasil costuma ficar de fora de alianças desse tipo”, disse Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima. Um dos exemplos usados pelo ambientalista é a Declaração de Florestas em Nova York, no ano passado. “Entre boa vontade e ação, porém, vai uma distância”, completou, citando o planejamento do Brasil em investir em combustíveis fósseis na próxima década.
A principal mensagem da adesão ao grupo é que o Brasil apoia, ou ao menos não é contra, a meta de longo prazo de reduzir emissões de forma a limitar o aquecimento do planeta em 1,5 grau Celsius em relação ao período pré-industrial, principal ponto de convergência da coalizão. “O problema que alguns países têm com esse tema é que, se esta não é a única trajetória, por que isso deve ser mencionado no acordo?”, disse o ex-chanceler brasileiro Luiz Figueiredo.
O diplomata analisa as projeções do painel de clima das Nações Unidas, que sinalizam que os custos de adaptação em um mundo 2 graus Celsius mais quente seriam mais altos que em um limite menor, de 1,5 grau Celsius. Para Figueiredo, o que importa é que a meta esteja no texto. “Não é um problema para o Brasil [mencionar a meta]. É um problema para outros.”
Liderança do Brasil
Tony deBrum, chefe da delegação das Ilhas Marshall, afirmou que a presença do Brasil no grupo é importante, pela demonstração de ambição do país nas negociações. “Ter o Brasil a bordo é essencial para o nosso sucesso”, disse. DeBrum quer garantir que os diplomatas e ministros voltem para casa “tendo feito o que vieram fazer em Paris”.
O Brasil também foi mencionado pela sociedade civil internacional como uma liderança na última rodada de negociações do acordo de Paris. Segundo a CAN (Climate Action Network), a participação do país foi crucial para resolver impasses nos temas mais complexos, como finanças e diferenciação.
Não há novidades sobre o texto do acordo. No fim do dia, o presidente da COP21, o francês Laurent Fabius, chamou os negociadores a assumirem a responsabilidade de um compromisso em nome do interesse de todos. “É preciso saber terminar uma negociação”, disse.
Além da menção a 1,5 grau Celsius como limite de aquecimento global, a última versão do texto trazia avanços em finanças, estabelecendo que os países ricos devem prover US$ 100 bilhões anuais a partir de 2020 para ações de mitigação e adaptação em países vulneráveis. Ainda havia indefinições sobre revisão das metas e o texto não continha a meta de zerar emissões de carbono.
O documento também indica um convite ao IPCC para formular cenários climáticos para o aquecimento a 1,5ºC em 2018. Atualmente, só existem projeções científicas sobre o aquecimento de 2ºC do planeta em relação ao período pré-industrial.