Ativistas pressionam na COP27 por libertação de preso em greve de fome no Egito
Alaa Abd El-Fattah, encarcerado pela ditadura egípcia por causa de um post no Facebook, parou de beber água há dois dias e seu estado de saúde é desconhecido
DO OC – “Não há justiça climática sem direitos humanos”. Sob esse slogan, ganhou destaque no terceiro dia da COP27 a situação de Alaa Abd El-Fattah. O ativista egípcio-britânico de 40 anos, um dos líderes da Primavera Árabe, de 2011, está preso desde 2019 pelo regime do ditador Al-Sisi. Alaa está em greve de fome há sete meses, parou de comer totalmente há uma semana e de beber água no último domingo, primeiro dia da conferência. Corre o risco de morrer durante o evento caso não haja uma solução imediata para o seu caso. O corpo humano suporta, em média, de três a quatro dias sem água.
Nesta terça-feira (8/11), a irmã de Alaa, a também ativista Sanaa Seif, denunciou as violações em entrevista coletiva promovida pela organização Demand Climate Justice e em painel no pavilhão do governo alemão na COP27, com participação de organizações como a Anistia Internacional e a Human Rights Watch. “Aconteça o que acontecer, Alaa já venceu a causa. A batalha simbólica foi vencida com todo o apoio que ele recebeu. Agora, só espero que o corpo dele não tenha sido sacrificado por isso”, declarou. A irmã do prisioneiro político afirmou que, após a informação de que Alaa havia parado de beber água no último domingo, a família não recebeu mais notícias. “Minha mãe esperou por dez horas ontem, nos portões da prisão, pela divulgação do relatório semanal [sobre a situação do preso], mas eles não deram nenhuma informação. E, agora, ela está lá novamente”, disse.
O ativista é, desde abril deste ano, também cidadão britânico, direito concedido por sua ascendência materna. A família de Alaa e organizações de defesa dos direitos humanos aumentaram a pressão sobre o Reino Unido para que negocie uma solução imediata. “Muito se fala sobre as sólidas relações entre o Reino Unido e o Egito. Os cidadãos são também parte dessa sólida relação?”, questionou sua irmã. Sanaa destacou a importância da solidariedade internacional, especialmente a vinda dos ativistas climáticos e por direitos humanos. Ela reconheceu também as iniciativas de governos como o da Alemanha, que promoveu o painel de hoje em seu pavilhão, mas ao mesmo tempo questionou as ações e relações econômicas com o governo egípcio.
A principal demanda da família é que Alaa receba uma visita da embaixada britânica ou seja imediatamente deportado para o Reino Unido. “Estamos falando de um homem que se negou a comer por sete meses porque quer uma reunião com a sua embaixada. É um pedido muito simples”, declarou, destacando a necessidade de uma solução rápida. “Existem saídas para salvar Alaa que não dependem de clemência do governo egípcio. Pedimos que ele seja deportado para seu outro país [o Reino Unido] e que o deixem enfrentar lá um julgamento justo”, afirmou.
Nesta terça, o alto comissário da ONU para Direitos Humanos, Volker Türk, exigiu a libertação imediata do ativista durante entrevista coletiva em Genebra.
Tumulto e provocações
Tanto na coletiva durante a COP27 quanto no painel “Justiça Climática e Direitos Humanos”, promovido pelo governo alemão, o momento de perguntas do público foi marcado por tensões, gritos e tentativas de provocação. Dois homens com crachás de “país-sede” gritaram palavras contra o ativista enquanto o público cantava em defesa da libertação de Alaa. Um desses homens buscava a tradução para a frase em árabe “Alaa é um terrorista” em seu celular.
Durante a coletiva, os dois se dirigiram à irmã do ativista, em árabe, perguntando os motivos do pedido por uma intervenção de países ocidentais no caso, já que Alaa é um cidadão egípcio. Ao tentar respondê-los, Sanaa foi interrompida aos gritos, e somente após a intervenção da equipe de segurança da ONU conseguiu concluir sua fala. Ela reforçou as inúmeras tentativas de negociação com o governo egípcio, o caráter arbitrário da atual prisão e relembrou também a dupla cidadania do irmão, assim como o pedido para que seja deportado e julgado no Reino Unido.
Já no painel, uma senhora pediu a palavra e se apresentou como integrante de uma organização de defesa dos direitos de mulheres. Reivindicando a necessidade de a defesa dos direitos humanos e das mulheres caminharem juntas, ela alegou ter “tentado atuar” pela libertação de Alaa e ter descoberto que ele seria acusado de agressão por “centenas de mulheres”. Ela foi identificada por Sanaa como integrante do governo egípicio assim que pediu a palavra e, logo após sua fala, foi rebatida pelo também palestrante Hossam Bahgat, da organização Egyptian Initiative for Human Rights. Ele a desafiou a apresentar as supostas vítimas e acusações de agressão, destacando a existência de uma campanha de desinformação contra o ativista.
Baghat relembrou as causas do encarceramento de Alaa, que foi uma das principais vozes dos protestos que, em 2011, levaram à dissolução do governo do ditador Hosni Mubarak após três décadas no poder. Alaa enfrentou diversas prisões desde então. A mais recente, em 2019, ocorreu sob alegação de “disseminação de informação falsa” após o ativista ter compartilhado um post no Facebook criticando a violência policial no Egito. Ele foi condenado a cinco anos de prisão. O representante da Egyptian Initiative for Human Rights lembrou que existe, inclusive, um comitê criado pelo próprio governo para reavaliar a situação dos presos políticos e que cerca de 800 pessoas encarceradas sob as mesmas acusações já foram soltas.
Solidariedade
Hossam Bahgat encerrou sua intervenção convocando todos os participantes da COP27 a participar de um ato simbólico de solidariedade na próxima quinta, 10, vestindo roupas brancas, cor dos uniformes de prisioneiros no Egito. “Esperamos que seja um ato de comemoração da libertação de Alaa e de solidariedade aos outros milhares de presos políticos no país.” (LEILA SALIM)[:]