Protesto de organização de jovens durante a reunião de Bonn (Foto: Claudio Angelo/OC)

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Negociação avança, mas texto pode crescer

Reunião preparatória para conferência de Paris termina nesta sexta-feira em Bonn com mais peças no lego do clima; Brasil enfrenta China e evita retrocesso

03.09.2015 - Atualizado 11.03.2024 às 08:26 |

CLAUDIO ANGELO
(DO OC, EM BONN)

Diplomatas reunidos em Bonn para a penúltima reunião preparatória do acordo da COP21 (a conferência do clima de Paris) podem sair da ex-capital alemã nesta sexta-feira (4/9) com um texto maior do que o que havia quando eles chegaram. Mas isso não é necessariamente uma má notícia: segundo delegados e observadores que participam do encontro, há avanços nas negociações.

“Negociações” pode não ser exatamente o termo aqui, já que nenhum dos pontos polêmicos do acordo foi efetivamente negociado entre os países. O que os representantes dos governos estão fazendo é avançar na montagem do imenso lego em que se transformou o rascunho do acordo de Paris, que hoje está inserido num texto de 83 páginas dividido em três partes.

Nesse esforço de montagem, as peças foram separadas por cores, por assim dizer: elementos que os dois coordenadores da negociação acharam que devem integrar o tratado climático (que vem sendo chamado por alguns de Acordo de Paris), com força de lei internacional, estão separados de elementos que devem integrar uma decisão da COP – uma espécie de decreto que complementa o tratado. Outros elementos, sobre os quais ainda não há muita clareza, foram separados num terceiro bloco: são as peças de cores diferentes ou que não se encaixam em lugar nenhum.

Às vezes, para produzir um encaixe, é preciso acrescentar mais uma peça ao conjunto. Foi o que aconteceu, por exemplo, com a apresentação de duas propostas sobre perdas e danos na quinta-feira: uma dos países menos desenvolvidos e das nações insulares, encampada pelo G77 (bloco das nações em desenvolvimento) e outra dos Estados Unidos, Austrália e Suíça. A questão das perdas e danos – ou seja, como os países ricos poderão compensar os países pobres por efeitos da mudança do clima aos quais não é possível se adaptar – havia ficado nesse terceiro bloco de pecinhas soltas.

“Eu não ficaria surpresa se o texto crescesse”, afirmou ao OC uma especialista que acompanhou a reunião de Bonn. Alden Meyer, da União dos Cientistas Responsáveis, disse que preocupar-se com o tamanho do texto agora é o “foco errado”.

Outro tema que avançou e deve aparecer de outra forma na futura nova versão do texto, que deverá ser apresentada após a reunião de Bonn, é o da transparência sobre o cumprimento das metas. Ministros reunidos ao longo deste ano têm concordado que precisa haver um mecanismo universal de verificação dos cortes de emissões de cada país – em vez de cada um contabilizar suas reduções como bem entender. “As discussões no nível ministerial têm descido até as negociações”, afirmou a especialista.

Embora o clima geral das conversas tenha sido positivo, embates e impasses permanecem. A questão crucial do financiamento – sem o qual não há acordo com os países em desenvolvimento – não foi tratada, e há quem ache que o acordo de Paris não terá um número para financiamento após 2020. “As pessoas ficaram tão obcecadas com os US$ 100 bilhões necessários para 2020 que perderam de vista o pós-2020”, disse a mesma observadora.

Outro ponto crucial, o das revisões periódicas de ambição das metas, tem futuro incerto: países como União Europeia e Brasil defendem ciclos de cinco anos, para não “travar” metas ruins num prazo longo. Acontece que a própria razão de ser das revisões – o aumento da ambição – só agora começa a ter consenso: até aqui, o único consenso era que não poderia haver redução da ambição.

O Brasil ganhou elogios por sua atuação durante o encontro. Os brasileiros em dois momentos chegaram a se estranhar com a China e alguns outros parceiros do G77: ao se opor a que os chineses movessem um grande bloco de texto da terceira parte para a primeira parte do lego, o que representaria um retrocesso na formatação do Acordo de Paris; e ao dizer claramente que o Brasil é contra a diferenciação dos países em anexos, como o atual Anexo 1 (desenvolvidos) e o não-Anexo 1 (em desenvolvimento).

O Itamaraty ainda tem esperanças de emplacar em Paris sua proposta de diferenciação por círculos concêntricos, com as nações em desenvolvimento migrando para a posição das desenvolvidas (o que implica em metas mais firmes) ao longo do tempo.

Embora surpresas sempre possam acontecer, o desfecho mais provável da reunião de Bonn será um novo pedido aos co-presidentes, o argelino Ahmed Djoghlaf e o americano Daniel Reifsnyder, para que produzam mais um texto com base no que foi discutido na reunião preparatória. Esse texto seria apresentado antes da próxima reunião preparatória, que acontece em outubro. Como tudo ainda está por fazer e há apenas mais cinco dias de negociação antes de Paris, essa reunião será provavelmente estendida em alguns dias.

“Para quem olha de fora, parece que esse processo não está indo a lugar nenhum. Mas nós gostamos de pensar nele como um grande projeto de construção civil; se você pensar que estamos tentando construir uma casa para a ação climática no futuro, então dá para entender que as coisas podem ser lentas”, afirmou Jaco du Toit, do WWF. “Mas precisamos ter em vista que o inverno está chegando, e nós ainda não temos uma casa.”

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